Com forma bem parecida com a de uma borboleta, a glândula tireoide é localizada na parte anterior do pescoço, logo abaixo do Pomo de Adão. A tireoide secreta dois importantes hormônios, a tiroxina (T4) e a triiodotironina (T3), ambos com efeito de controlar o crescimento, o metabolismo e o desenvolvimento corporal, desempenhando funções na produção de proteínas estruturais, enzimas e outros hormônios, além de regular a função de importantes órgãos como o coração, o cérebro, o fígado e os rins. Contudo, o papel mais importante dos hormônios é a estimulação do metabolismo das proteínas, dos lipídeos e dos carboidratos. Também elevam o consumo de oxigênio e a produção de calor, manifestada por uma elevação na taxa metabólica basal.
Dentre as alterações endócrinas mais comuns, destacam-se as desordens da glândula tireoide, em especial o hipotireoidismo. Quando a tireoide não funciona de maneira correta, pode liberar hormônios em quantidade insuficiente, causando o hipotireoidismo, ou em excesso, ocasionando o hipertireoidismo. Nessas duas situações, o volume da glândula pode aumentar, o que é conhecido como bócio.
O hipotireoidismo, estado clínico resultante da deficiência de hormônios tireiodeanos, é responsável por várias alterações corporais, que podem induzir doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) como obesidade, dislipidemias e até mesmo algumas neoplasias.
Ressalta-se, no entanto, que a dieta é um dos fatores de risco para o surgimento e o agravamento do hipotireoidismo. Para que ocorra a síntese e a função adequada dos hormônios da tireoide (HTs), são requeridos muitos micronutrientes como iodo, selênio e zinco. Outras substâncias provenientes da ingestão de alimentos podem influenciar no funcionamento da tireoide, dentre as quais os glicosinolatos, o glúten, as isoflavonas e os flavonoides.
Alimentos para prevenção do bócio:
· Peixes marinhos, ricos em iodo e ômega 3: salmão do pacífico, arenque, sardinha e anchova;
· Alimentos ricos em gorduras monoinsaturadas: azeite de oliva, abacate, castanhas, nozes, sementes de gergelim e abóbora;
· Alimentos ricos em selênio: levedo de cerveja, castanha-do-pará, gérmen de trigo e grãos integrais;
· Alimentos ricos em Zinco: carne vermelha, semente de gergelim, semente de abóbora, iogurte, espinafre.
Um artigo publicado em 2016 no periódico Demetra: alimentação, nutrição & saúde pelas pesquisadoras Thais Regina Mezzomo e Juliana Nadal, teve como objetivo elaborar uma revisão de literatura sobre nutrientes e substâncias alimentares que podem impactar na função tireoidiana. Foi realizada revisão bibliográfica utilizando associação entre os descritores “hipotireoidismo”, “iodo”, “selênio”, “zinco”, “soja”, “glúten” e “flavonoides”, na base de dados Pubmed, em 2014. Abaixo, relacionamos alguns dos achados das pesquisadoras:
Iodo
O iodo é o elemento essencial para a síntese dos hormônios tireoideanos (HTs), além de ser essencial para o crescimento e desenvolvimento, particularmente do cérebro e do sistema nervoso central. As pesquisadoras observaram que o iodeto participa da reação de organificação (ligação do iodo com a molécula da tireoglobulina) e posteriormente se acopla a resíduos de tirosil para formar os hormônios tireoidianos. Quantidades excessivas ou deficitárias de iodo contribuem para alterações tireoidianas, entre as quais o hipotireoidismo. O selênio e o zinco são cofatores para reações de deiodinação, as quais transformam a tiroxina (T4) em triiodotironina (T3) perifericamente. A deficiência desses minerais pode ser desenvolvida em dietas restritivas ou alimentação desequilibrada em qualquer fase da vida, colaborando com a diminuição da produção dos hormônios tireoidianos. Sua deficiência é um problema de saúde pública mundial, acometendo cerca de 800 milhões de pessoas apresentam hipotiroidismo
Produção dos hormônios tireoidianos. TRH: hormônio liberador de tireotropina; TSH: hormônio estimulante da tireoide; TPO: peroxidase da tireoide; T4: tiroxina; T3: triiodotironina.
Selênio
O selênio é um elemento-traço importante para os mecanismos antioxidantes, para o sistema imunológico, e ainda participa ativamente da homeostase da glândula tireoide. A deficiência de selênio tem sido um achado constante em doenças da glândula tireoide. Kandhro et al., observaram que a deficiência de selênio em indivíduos hipotireoideos pode desempenhar papel importante na severidade do hipotireoidismo associado com deficiência de iodo. A RDA atual de selênio para adultos é de 55 μg/dia. Gestantes e lactantes devem ter suas ingestões aumentadas para 60 e 70 μg/dia, respectivamente. Carnes e frutos do mar são ótimas fontes de selênio, bem como a castanha do Brasil. Contudo, a concentração de selênio nas castanhas varia de acordo com a capacidade de absorção da árvore e com a composição do solo. A concentração média de selênio em uma unidade média de castanha do Brasil é de 27,4μg; portanto, o consumo de duas unidades diárias é suficiente para abranger a RDA. O teor de selênio nas carnes e pescados varia entre 2,8 a 80,9 μg/100g de alimento, sendo os pescados (atum e sardinha, principalmente) os alimentos com maior quantidade deste mineral. O feijão preto e a farinha de trigo integral também apresentam quantidades importantes de selênio, sendo 11,9 μg/100g e 13,6 μg/100g, respectivamente.
Zinco
Há relatos, na literatura, de que a deficiência de zinco é uma causa de hipotireoidismo subclínico, pois esse mineral aumenta a atividade da ID II. Em estudos com animais, a deficiência de zinco resultou em diminuição de aproximadamente 30% nos níveis de T3 e T4 livres. Em seres humanos, a suplementação de zinco restabeleceu a função tireoidiana normal em pacientes com hipotireoidismo. A RDA de zinco é de 15mg/dia,21 podendo essa quantidade ser encontrada em carnes e pescados, com quantidades variando entre 4 e 7,7mg/100g de alimento e em castanhas e nozes, com concentrações de 2,1 a 4,7mg/100g de alimento.42 Segundo a POF 2008-2009, 19,9% das crianças e adolescentes e 29% dos adultos e idosos apresentam consumo inadequado desse nutriente.
Soja
Alguns estudo estudos mostram o potencial da soja para a saúde humana na prevenção de neoplasias, de doenças cardiovasculares, redução dos sintomas da menopausa, aumento da densidade mineral óssea e diminuição da resistência insulínica. Por outro lado, a soja tem gerado preocupação sobre a função da glândula tireoide. Pacientes com hipotireoidismo subclínico apresentam risco três vezes maior de desenvolver hipotireoidismo com suplementação de 16mg fitoestrógenos da soja ao dia. Em estudo realizado com mulheres na menopausa, 75mg de isoflavonas reduziram os níveis de T3 livre, bem como aliviaram os sintomas da menopausa. Há uma preocupação teórica com base em estudos in vitro e em animais, de que indivíduos com função tireoidiana comprometida e/ou cuja ingestão de iodo é marginal podem aumentar o risco de desenvolver hipotireoidismo com o consumo de soja. Assim, é importante que consumidores de alimentos a base de soja certifiquem-se de que sua ingestão de iodo seja adequada. Além disso, a soja pode bloquear a absorção de medicamentos para a tireoide.
Flavonoides
Flavonoides, tanto sintéticos quanto de ocorrência natural, possuem potencial para interferir no metabolismo dos HTs in vitro. Derivados de flavonoides sintéticos diminuem as concentrações séricas de T4 e inibem tanto a conversão de T4 para T3 quanto a depuração metabólica de T3r pelo selênio. Catequinas, flavonoides encontrados em abundância no chá verde, diminuem as atividades de TPO, da 5’D e dos níveis de T3 e T4, juntamente com elevação significativa de TSH. Ainda não está claro se efeitos semelhantes ocorrem in vivo, ou ainda, se ocorrer, se são restritos a flavonoides específicos e em quais dosagens. Uma vez isolado ou concentrado, os flavonoides são cada vez mais utilizados como intervenções terapêuticas, mas pesquisas adicionais sobre a influência potencial dessas substâncias no metabolismo de HTs são desejáveis. Cuidado deve ser tomado principalmente em indivíduos com deficiência nutricional de iodo, pois pode contribuir para o desenvolvimento de hipotireoidismo e bócio. Como exemplos de alimentos fonte, têm-se feijão, soja, milho, pinhão, brócolis e canola.
Brássicas
As brássicas, brócolis, couve-flor, couve-de-bruxelas, couve-manteiga, nabo, rabanete, repolho, além de alho e cebola são fontes de glicosinolatos. Quando esses alimentos são cortados crus, ocorre interação entre os glicosinolatos e a enzima mirosinase, que catalisa a formação do tiocianato, isotiocianato e nitrila. Estas substâncias ingeridas por meio da alimentação podem competir com o iodeto pela entrada nos folículos tireoidianos e comprometer a síntese dos hormônios, bem como a soja, que pode inibir a tireoperoxidase, enzima constituída de um grupo heme glicosilado ligado às proteínas da membrana apical das células foliculares da tireoide, responsável pela oxidação do iodeto e formação dos hormônios tireoidianos quando há deficiência de iodo.
Este estudo limitou-se a utilizar a base de dados Pubmed. Sugere-se que outras pesquisas sejam realizadas em outras bases de dados, bem como seja verificada a possível interferência de outros nutrientes ou substâncias alimentares na função tireoidiana
Referências
Efeito dos nutrientes e substâncias alimentares na função tireoidiana e no hipotireoidismo
http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/demetra/article/view/18304#.WIoeZRsrK00
10 Coisas que Você Precisa Saber sobre Tireoide
http://www.endocrino.org.br/10-coisas-que-voce-precisa-saber-sobre-tireoide/
O que são isotiocianatos, suas propriedades e onde encontrar na alimentação
https://gracasnutric.wordpress.com/2014/02/22/o-que-sao-isotiocianatos-suas-propriedades-e-onde-encontrar-na-alimentacao/
Effects of selenium supplementation on iodine and thyroid hormone status in a selected population with goitre in Pakistan.
Tireoide e nutrição. Goldfeder RT. In: Silva SMC, Mura JDP. Tratado de alimentação, nutrição e dietoterapia. 2ª ed. São Paulo: Roca; 2010. p.1003-1012.
Peripheral metabolism of thyroid hormones: a review.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10956378
Soy extracts suppressed iodine uptake and stimulated the production of autoimmunogen in rat thyrocytes.
Serum selenium is low in newly diagnosed Graves’ disease: a population-based study.
Iodine and thyroid function.
4 respostas
Dr, gosto muito da forma como escreve. Parabéns por mais um artigo.
Tenho uma dúvida, lendo recentemente textos do dr Ray Peat, que é considerado um dos maiores especialistas em tireoide da atualidade, observei que ele defende que TSH acima de 2 já indicaria hipotireoidismo e considera os ideal abaixo de 1. Na sua visão qual seria o tsh ideal?
feliz em saber que gosta
tambem trabalho com TSH em torno de 1
Boa noite! Tenho uma dúvida, quem tem hipotireoidismo não pode fazer o uso de flavonoides? Não entendi, na linhaça contém flavonoides. Obrigada
pode tomar sem problemas!